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DOI: https://doi.org/10.53934/9786585062046-22
Este trabalho foi escrito por:
Gabriele da Silva F. Cavalcante*; Cecília Rodrigues M. de Oliveira; Daísa Adriana da Silva; Júlia Martins S. de Souza; Leonino José da C. AlbuquerqueRobson de Azevedo A. Filho; Fabiana América S. D. de Souza
*Autor correspondente (Corresponding author) – Email: [email protected]
Resumo: O câncer é conhecido não apenas por múltiplas alterações genéticas, mas também epigenéticas que conduzem a propagação de células malignas e químio-resistentes. Dentre as ferramentas de edição gênica, uma das mais estudas e cobiçadas é a CRISPR. Sua flexibilidade e a facilidade de uso permitiram a pronta realização de praticamente qualquer alteração gênica com maior eficiência e menor custo do que as modalidades anteriores no estudo do câncer. Por essa razão, esta revisão de literatura visou destacar a utilização da tecnologia CRISPR no diagnóstico e terapia do câncer. Vários estudos utilizaram a técnica CRISPR para editar DNA genômico de células cancerígenas ex vivo e in vivo, e mostraram potencial para ampliação dos protocolos anti-câncer. Além disso, o CRISPR pode ser usado para corrigir mutações oncogênicas, descobrir drogas anticancerígenas e projetar células imunes e vírus oncolíticos para tratamento imunoterápico do câncer. A otimização do desempenho do sistema CRISPR deve impulsionar sua aplicação na medicina de precisão. E, os conhecimentos já existentes tem imenso potencial de uso para terapia personalizada do câncer.
Palavras–chave: Câncer; CRISPR; diagnóstico; terapia gênica
INTRODUÇÃO
Os diversos sistemas CRISPR/Cas9 (Sistema de Repetições Palindrômicas Curtas Agrupadas Regularmente Interespaçadas/Sistema de Nucleases de Associação), são adaptações genéticas, utilizadas por Bactérias e Arqueas, que capturam material genético dos bacteriófagos e adicionam ao seu próprio genoma para a familiarização com esses vírus, em caso de haver um segundo contato (1, 2). No geral, essa imunidade bacteriana adquirida, utiliza alguns tipos de RNA, como o CRISPR RNA (crRNA), o trans-ativador de RNA (tracrRNA) e RNA guia (gRNA) para ativar e guiar o sistema de proteínas Cas9, ligando-as com o DNA do invasor, possibilitando a clivagem das sequências do DNA viral (3).
Nessa perspectiva, a associação dessas formas de RNA é essencial para a formação de um guia duplo, eficaz no reconhecimento do alvo (3). E, com a evolução das pesquisas de edição genômica, a utilização do sistema CRISPR/Cas9 vem sendo extremamente significativa dentro dos ramos da biotecnologia, das produções de ferramentas para a edição do genoma e, principalmente, para os testes laboratoriais da terapia de câncer. A utilização desse sistema inclui diversas vantagens, como a rápida operação, design simples e baixo custo, sendo aplicável a quase todos os genomas (4).
A descoberta do sistema CRISPR e sua utilização para edição genética na terapia do câncer, fornece triagem personalizada para os diferentes aspectos genéticos das neoplasias, e possibilita o direcionamento na criação de terapias gênicas (2). A espécie comumente utilizada nos estudos direcionados ao diagnóstico e combate ao câncer, é a bactéria Streptococcus pyogenes, pois o seu CRISPR demonstra alta eficácia no processo de identificação e quebra do DNA a partir da proteína associada Cas, utilizando o RNA para reconhecer e atingir a região alvo, no caso, alcançar os genes causadores ou que estão relacionados a diferentes tipos de processos cancerígenos (4, 5).
A capacidade de quebrar fitas altamente específicas nas regiões alvo do DNA da endonuclease presente no CRISPR/Cas9, facilita a produção de reagentes knockout, tornando as edições genéticas baseadas na tecnologia CRISPR mais viável que as demais (6). Com essa técnica, várias alterações no tecido cancerígeno podem ser eliminadas de forma eficiente, além de genes supressores de tumores que estão inativados em decorrência do câncer podem ser tratados com este sistema (7).
Porém, ainda há muitas dificuldades encontradas acerca dessa ferramenta, como as diversas redes regulatórias que controlam as atividades celulares de neoplasias, tornam a identificação de um alvo genético singular um desafio para a eficácia da terapia com CRISPR/Cas9 (8). A problemática dos mecanismos transportadores dos genes em percorrer até o gene alvo e a indefinição deste através da longa sequência de nucleotídeos faz-se necessária a ampliação de estudos e pesquisas desenvolvidas para superar esses desafios, o que motiva o objetivo deste trabalho, que buscou revisar na literatura trabalhos direcionados ao estudo de edição genética através do sistema CRISPR/Cas9 para diagnóstico e terapia do câncer (9).
DIAGNÓSTICO DE CÂNCER ORIENTADO POR CRISPR
O diagnóstico do câncer pode ser desenvolvido a partir do aproveitamento do CRISPR que, após a digestão enzimática, pode identificar as alterações sequenciais características das células cancerígenas, a identificação pode ser feita por meio de microssatélites comuns. Também se destaca a capacidade de diferentes desenhos de aminoácidos para reconhecimento de possíveis mutações genéticas e o uso de sistemas como o SHERLOCK e DETECTR utilizando o CRISPR/Cas9 para diagnóstico prévio de alterações genéticas derivadas do câncer, fazendo uso de diferentes tipos de proteínas associadas, como, por exemplo, Cas13a (9).
Um dos estudos recentes com CRISPR, tem como intenção detectar mutações de p53 em tumores ovarianos, além de detectar ácidos nucleicos com o auxílio do Cas12. Essa junção com um repórter enzimático e um repórter trans, têm sido usados para identificar anomalias em amostras de vários pacientes. E, ainda, é possível que a mesma ideia seja utilizada para detectar infecções por SARS-CoV-2. É seguro afirmar que em alguns anos o CRISPR possa se tornar um sistema personalizado para o monitoramento e detecção do câncer (10).
CRISPR/ CAS9 E MEDICINA PERSONALIZADA NA TERAPIA DIRECIONADA AO CÂNCER
A medicina personalizada tem uma abordagem individualizada no que diz respeito a dados clínicos, genéticos e ambientais. Cada caso tem sua particularidade, por isso requer protocolos terapêuticos distintos (11). Em geral, pacientes com câncer do mesmo tipo respondem de maneiras diferentes ao processo terapêutico, separam-se por apresentarem quadros genéticas e epigenéticas diferentes, gerando exibições de transcriptoma – o conjunto completo de RNAs, proteoma – aglomerado de proteínas – e metaboloma, que é conjunto dos metabólitos em uma célula (2).
Alguns outros estudos apontam que os tumores primários e metastáticos devem ser tratados diferentemente, pois, se não houver alteridade do panorama de mutação ou na variação do número de cópias dos oncogenes condutores, os clones celulares continuarão evoluindo cada vez mais resistentes, assim, mitigando a eficácia da terapia (12). O êxito no desenvolvimento dos gRNA (RNA guia) fez das descobertas com uso do CRISPR/Cas as respostas aos questionamentos acerca da funcionalidade de determinado gene no câncer, e estes testes são melhores quando realizados in vivo ou ex vivo em camundongos de laboratório (10). Na tabela 1 observa-se aplicações do CRISPR/Cas9 para o tratamento de alguns cânceres.
CRISPR PARA MODELAGEM DE PESQUISA DE TUMORES
Para que seja possível um combate eficaz em tumores, é necessário entender os processos que os impulsionam. Porém, uma das principais dificuldades está nas múltiplas mutações genéticas que originam tais tumores, visto que, são de uma complexidade elevada, sendo um obstáculo na criação dos modelos completos de câncer (4). Contudo, ao utilizar o CRISPR/Cas9, é possível modelar rapidamente esses tumores animais para a identificação precoce das alterações gênicas, assim, conseguindo silenciar ou ativar algum gene sintetizadorde proteínas ligadas ao tumor (3).
Tabela 1. Algumas aplicações utilizando CRISPR/Cas9 no tratamento do câncer
Câncer | Gene alvo | Linhagem celular/animal | Método de Entrega | Resultado | Referência |
Carcinoma hepatocelular | LIN28B-AS1 | Linhagem celular HepG2 de ratos | Lipofectamina 2000 | Atenuação do crescimento do tumor | (13) |
Câncer colorretal | MUC5AC | Linhagens celulares HCT-8 e LS174T Camundongos | Lipofectamina 2000 | Redução da tumorigênese e quimiorresistência ao direcionar a sinalização de CD44/β-catenina/p53/p21 | (14) |
Câncer colorretal | LSD1 | Linhas celulares T29, SW480, HCT116, LoVo e RKO | Lentivírus | Inibição de transição epitelial-mesenquimal e migração mediada por Akt | (15) |
Câncer de mama | Osteopotina | Linhagem celular MDA-MB-231 | Lentivírus | Provocando radiossensibilidade signifcativa | (16) |
Vários cânceres | FOs | Linhagens celulares A673, RD-ES e U2OS de ratos | Lentivírus | Reduzindo a carga/mortalidade do tumor | (17) |
Câncer de próstata | BRCA2 | Linhagens celulares LNCaP, DU145, 22RV1 e TRAMP-C2 de Camundongos | Lentivírus | Efeitos antiproliferativos | (18) |
Câncer de próstata | Akt1/2 | Linhagem celular CWR22Rv1 De Ratos | Plasmídeo (px300) | Metástase suprimida | (19) |
Outros fatores importantes para modelagem e o uso do CRISPR estão na identificação de genes envolvidos na resistência terapêutica, podendo ser uma forte estratégia na composição de medicamentos mais eficazes. Essa estratégia permite uma maior rapidez nas pesquisas direcionadas ao tumor e a criação de modelos in vitro em linhagens de mamíferos, geralmente, camundongos, com deleção de um ou vários genes. Além disso, o CRISPR é aplicado para ativar ou desativar alelos funcionais para desenvolver resistência às drogas in vitro, isto permite avaliar rapidamente genes candidatos ou mutações específicas associadas à resistência medicamentosa (21).
OTIMIZAÇÃO DA EDIÇÃO DE GENES PARA TERAPIA DO CÂNCER
A terapia por edição genética busca sempre garantir maior eficiência e rapidez nos resultados, mas a carga de mutações do câncer é de difícil compreensão. Sendo assim, uma nova estratégia vem sendo descrita por pesquisadores, utilizando camundongos para simular o desenvolvimento de vários tipos de cânceres e incorporando mutações específicas de pacientes. Essa técnica permite um estudo específico e personalizado, mesmo em cânceres raros, possibilitando o surgimento de hipóteses acerca de novos alvos terapêuticos que direcionam a utilização do CRISPR/Cas9. A maioria desses trabalhos relacionados a edição genética ocorrem in vitro, contudo há também o desenvolvimento de outros ensaios clínicos (6).
Nesse contexto, apesar de ser uma tecnologia que está em constante evolução, a fim de melhorar a eficiência e precisão da sua aplicabilidade, fatores como a ineficácia na entrega da terapia CRISPR/Cas9 pode acometer dificuldades no processo da edição de genes. A utilização de camundongos imunocompetentes nas pesquisas é animadora, visto que é possível observar a interação entre o tumor e o sistema imune. E, essas novas descobertas podem ter implicações vantajosas, já que, com o CRISPR pode-se realizar marcações no DNA, mapeamento genético, regulação da expressão de genes, entre outros (22).
CRISPR E IMUNOTERAPIA TUMORAL
Uma estratégia adotada pela célula cancerosa e um dos principais mecanismos para sobreviver e se adaptar no microambiente tumoral, enquanto o sistema imunológico não a reconhece, é denominada de escape imune tumoral. Essa estratégia, possibilita que o câncer controle as células do sistema imune através de múltiplas vias, isso faz com que favoreçam o desenvolvimento da neoplasia e a metástase, ocorrendo assim a progressão de células tumorais. Nesse sentido, a imunoterapia é vista como uma grande estratégia para direcionar as células cancerígenas no tratamento contra o câncer (23).
Para Kick et. al. (24) as células T no sistema imunológico humano desempenham um importante papel na proteção e defesa do organismo, combatendo infecções patogênicas e eliminação de células com mutações, através de um modelo de reconhecimento específico realizado pelo meio dos receptores de células T (TCRs). A imunoterapia se baseia na estratégia de reconhecimento dos TCRs para aumentar a eficácia antitumoral das células e assim originar células T geneticamente modificadas e equipadas com receptores de antígenos (3).
No entanto, o principal entrave nessa estratégia é a eficácia limitada das células T que foram alteradas geneticamente no tratamento de tumores sólidos. Diante disso, uma nova maneira de aumentar a eficácia de células T para o tratamento clínico de diferentes tipos de câncer se dá através do sistema CRISPR. Atualmente, o CRISPR tem sido utilizado em vários ensaios clínicos de imunoterapia em andamento, no entanto ainda há diversos desafios quanto à segurança e eficácia no uso para aplicações clínicas (24). Alguns ensaios são demonstrados na tabela 2.
CRISPR NO GENOMA OU SUBGENOMA PARA IDENTIFICAÇÃO DE ALVOS DE DROGAS PERSONALIZADAS
O CRISPR apresenta uma triagem em todo o genoma ou subgenoma com alto rendimento para validar a contribuição de milhares de elementos genéticos, sendo eles o próprio gene, miRNA, gene codificador de proteínas e outras substâncias. O DNA contém um sistema de reparo que é ativado automaticamente a fim de corrigir a clivagem das partículas, mas vale ressaltar que nesse ajuste pode decorrer a retirada ou inativação de um gene do genoma de forma precisa. É essa capacidade que permite elementos genéticos direcionados em um genoma, o que se denomina por tela ampla do genoma (28, 2).
Diante disso, as telas CRISPR são aplicadas para o rastreamento de reguladores com dependências genéticas ou comunicações gênicas letais sintéticas, possibilitando que os pesquisadores descubram novas técnicas genéticas para fenótipos celulares. Então, ao aplicar as técnicas de maneira personalizada em várias linhagens celulares, em modelos in vitro ou transplantes in vivo, pode-se identificar genes essenciais nas células tumorais evidenciando potenciais alvos para terapias anticâncer com alvos de drogas específicas (29, 30).
Tabela 2. Alguns ensaios clínicos em andamento usando tecnologias CRISPR para projetar imunoterapias para o tratamento de cânceres humanos com alvos nas células imunológicas.
RAQ = Receptor de Antígeno Quimérico; PD1 = Proteína de Morte Celular Programada 1; RCT = Receptor de Células T; SHIC = Proteína Contendo SH2 Induzível por Citocina; CPHC-I = Complexo Principal de Histocompatibilidade Classe I; PHQ1 = Progenitora Hematopoiética Quinase 1
MODIFICAÇÃO CRISPR/CAS9 DE CÉLULAS NÃO CANCEROSAS DIRECIONADAS PARA TRATAR O CÂNCER
Apesar de existir uma infinidade de opções para atingir células cancerosas pela técnica de CRISPR/Cas9, ainda existem obstáculos, como a heterogeneidade do tecido canceroso, que dificultam a edição genética seletiva para o câncer. Por conseguinte, o gene escolhido como alvo da terapia pode não estar presente em todas as células da neoplasia e a edição ocorre apenas nas que possuem esse gene, enquanto as demais resistem e se multiplicam livres e vantajosamente, ocupando a lacuna deixada pelas que sucumbiram ao tratamento (12, 5).
Uma alternativa para superar esse impasse é a modificação de células estromais que rodeiam as neoplasias, já que, essas células são mais estáveis geneticamente e sua função é auxiliar na proteção e nutrição de células próximas. Esse mecanismo, apesar de ser essencial em pacientes saudáveis, acaba dando suporte ao desenvolvimento cancerígeno em pacientes afetados. A inibição, no tecido saudável, da via metabólica que possibilita essa troca nutricional pode causar morte na célula cancerosa (31).
TERAPIAS BASEADAS EM CRISPR EX VIVO
Em testes ex vivo, a transdução do genoma é inoculada em camundongos receptores, através de enxertos e, assim, identificados os controles de metástase. Este processo é realizado de duas formas, a primeira é o direcionamento da quebra da fita dupla de DNA, seguido do aumento e direcionamento de genes para iniciar a reparação homóloga precisa – HDR. O outro método utiliza as enzimas dos Cas para modificar diretamente o DNA. Alguns pesquisadores desenvolveram um estudo que provam o quão bem pode ser utilizado para atingir vários reguladores, outros estudiosos,por sua vez, usavam a estratégia baseada em telas para marcar os alvos na superfície celular de dezenas de anticorpos, esse tipo de abordagem faz uma simplificação na hora de validar essas novas terapias (10).
Com os recentes experimentos biotecnológicos, são realizadas as interrupções de proteínas influenciadoras de morte celular (PD1) através da técnica de CRISPR/Cas9 ao guiar o metabolismo das células T (linfócitos) a impedir o avanço tumoral (32). Em 2020, Stadtmauer et al., realizaram os primeiros passos de uso de CRISPR em humanos, introduzindo em 3 pacientes com cânceres em estágios avançados, com células T modificadas ex vivo, esse CRISPR foi ligado a Cas9 e levaram a carga necessária para a resistência e combate ao tumor. Desse modo, garantiu-se a permanência e eficácia prolongada das células T programadas para melhorar o processo imunoterápicos dos pacientes (33).
POTENCIAL PRÉ-CLÍNICO DE TERAPIAS CRISPR IN VIVO
O processo pré-clínico é um meio rápido e econômico para o desenvolvimento da triagem de evolução das vulnerabilidades de células cancerígenas. Durante o processo, são desenvolvidos tecidos contextuais para que as células consigam interagir entre si, para introduzir diretamente o CRISPR é preciso superar vários empecilhos. As técnicas CRISPR na prática clínica estão entregando sucessos em tratamentos e como uma alternativa para casos em que intervenções cirúrgicas e farmacêuticas não são eficientes. Devido às dificuldades das aplicações do sistema CRISPR/Cas, iniciou-se o desenvolvimento de um novo sistema denominado Casmini que foi projetado a partir do sistema VF tipo 2 (CRISPR-Cas12f) e evoluiu através do RNA guia e das engenharias de proteínas (34).
Nessa perspectiva, esse novo sistema tem atividade equivalente a Cas12a, embora não tenha a mesma capacidade de realizar algumas práticas, como as modificações genéticas em células de mamíferos. No entanto, as proteínas efetoras Cas, caracterizam-se menores que o limite de subordinação de VAA (vírus Adeno-Associado) e essa limitação acaba refletindo na entrega do in vivo (35). Além disso, existem alguns exemplos específicos dessa terapia, envolvendo tratamento sobre a fusão de genes oncogênicos, e reforçando a seletividade das células tumorais devido à fusão, ou seja, após a fusão a célula recupera a capacidade de desenvolver sua função, assim, parando de se multiplicar promovendo a ruptura da lesão genética que impele o tumor (10).
As conhecidas telas CRISPR in vivo são executadas com as bibliotecas de RNAs guia junto ao código de barras para identificar escopo terapêutico personalizado que apresente maior poder estatístico. Também há um sistema específico para a entrega de técnicas in vitro que é a MiniCAFE, porém este sofre influência da VAA com base nos modelos in vivo. Desta forma, essa terapia gênica assim como qualquer outra descoberta requer estudos pré-clínicos objetivos (36).
LIMITAÇÕES NA TERAPIA MEDIADA POR CRISPR/CAS9
O CRISPR tem um grande potencial no direcionamento de genes, porém há algumas dificuldades, a exemplo da limitação no efeito fora do alvo (OTEs) que atrapalha o uso amplo em terapias gênicas. Muitas possibilidades ainda estão sendo exploradas, porém, a segurança clínica e a eficácia de tais sistemas ainda precisam ser minuciosamente estudadas e identificadas (37). Assim, o refinamento com efeitos mínimos de alvo e em um tamanho que permita sua embalagem para os veículos de entrega amplamente utilizados são algumas das principais áreas de impulso a serem abordadas num futuro próximo. Essas otimizações aproximam o CRISPR das clínicas de oncopatologias (38).
Apesar dos estudos promissores, ainda há algumas limitações ao se trabalhar com o CRISPR/Cas9, entre elas é possível citar a condução da Cromotripsia, mutação genética danificadora estrutural do núcleo de cromossomos que causam doenças congênitas humanas e câncer, a perda e a seleção de genes supressores tumorais como o p53, o comprometimento da função celular normal, ou ainda, um dano ao DNA que pode levar a apoptose, ou mesmo além da cura o desencadeamento do câncer. Porém, mesmo levantando algumas suspeitas sobre a terapia com CRISPR, nenhum estudo confirmou que ele pode ter alguma relação diretamente com o impulsionamento do câncer (39).
DIREÇÕES FUTURAS PARA CRISPR/CAS9 NA TERAPIA DO CÂNCER
Em uma análise da concretização da promessa CRISPR/Cas9 realizada no câncer de transição, espera-se que a maioria das linhagens de células cancerosas sejam cobertas por triagens CRISPR agrupadas. Diante disso, será possível a observação de interações letais sintéticas e a identificação de novos escopos terapêuticos, no entanto, especialistas apontam ser necessário o aprofundamento quanto à eficácia e segurança do paciente quando a técnica CRISPR é utilizada in vivo. E, à medida que os anos passam, os estudos e ensaios clínicos avançam tornando possível acreditar que esses editores genéticos têm potencial para tratar diversas doenças humanas, principalmente, o câncer (40, 6).
Apesar da grandeza de possibilidades a qual esse sistema CRISPR possui, componentes que são imunogênicos em humanos, ainda não estão suficientemente elucidados para essa utilização em potencial. A medicina personalizada oportuniza que os pesquisadores reproduzam a sequência genética responsável pela oncogênese em diferentes tumores a partir dos meios de cultura de organóides avançados e engenharia versátil apta para o sistema CRISPR/Cas9. Porém, como já mencionado, é importante aguardar confirmação dos estudos clínicos usando essa técnica terapêutica como escudo para combater o sistema imunológico do câncer (31).
CONCLUSÕES
De acordo com a literatura, foi possível concluir que o CRISPR é uma ferramenta personalizável, de fácil aplicação e baixo custo. E, teoricamente, é possível utilizá-la para tratar doenças infecciosas e cânceres. Porém ainda há muitas ressalvas para utilização desta técnica em processo de terapia gênica, principalmente envolvendo uma patologia tão complexa como o câncer. Uma grande problemática é a questão ética social ao modificar genes humanos e provocar mutações genéticas de escalas não programadas. Pois, mesmo com diversos testes positivos, é uma linha que muitos cientistas têm receio de cruzar. Por isso, faz-se necessário mais investimentos e comprometimento nos estudos que visem resultados não causadores de efeitos estocásticos. Para isso, será essencial otimizar a eficácia, segurança e especificidade do CRISPR antes de sua utilidade clínica. Sendo assim, investigadores de todo o mundo estão descobrindo diversas rotas para ajustar a entrega de CRISPR às células específicas no corpo humano. E, mesmo com essas atuais ressalvas, o CRISPR tem sido e continuará sendo, uma ferramenta chave em nossa busca para compreender e tratar cânceres humanos.
AGRADECIMENTOS
À Universidade de Pernambuco – Campus Mata Norte, que tem sido essencial para nossa formação; ao Laboratório de Biotecnologia da UPE – Campus Mata Norte (LABIOTEC UPE CMN), e por último, mas não menos importante, ao Grupo de Pesquisa, Extensão e Informação: ProBioTec, liderado pela Prof.ª Dr.ª Fabiana América S. D. Souza, primordial para aquisição de novos conhecimentos científicos, tornando possível o desenvolvimento deste trabalho.
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