AÇÃO ANTIMOCROBIANA DO ÓLEO ESSENCIAL DE GENGIBRE
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Capítulo de livro publicado no Congresso Brasileiro de Química dos Produtos Naturais. Para acessa-lo clique aqui.
Este trabalho foi escrito por:
Monica Aparecida da Silva *; Michelle Carlota Gonçalves ; Anderson Henrique Venâncio ; Bruna Azevedo Balduíno ; Roberta Hilsdorf Piccoli
*Autor correspondente (Corresponding author) – Email: [email protected]
Resumo: Os óleos essenciais (OE) de especiarias são eficientes antibacterianos naturais exibindo efetividade no controle de microrganismos deteriorantes e patogênicos de origem alimentar. Tais propriedades têm sido intensamente estudadas para a conservação de alimentos por ir de encontro a crescente conscientização popular sobre os riscos à saúde ligados ao consumo de conservantes alimentares artificiais químicos. Assim, o objetivo deste estudo foi determinar a concentração mínima bactericida (CMB) do OE de gengibre sobre as cepas ATCC 7644 e ATCC 15313 de Listeria monocytogenes. As CMBs dos OE foram determinadas pela técnica de microdiluição em caldo, em placas de poliestireno de 96 cavidades. O óleo essencial foi diluído em caldo de Triptona de Soja (TSB) contendo 0,6% de extrato de levedura e 0,5% de Tween 80, obtendo concentrações de 4 a 0,03%. Alíquotas de 100 μL da solução do óleo foram adicionadas ao primeiro poço de cada linha, contendo 100 μL de TSB/EL, e diluídas serialmente para obtenção das concentrações acima descritas. Alíquotas de 10 μl da cultura, contendo 108 UFC/mL foram inoculadas e as microplacas foram seladas e incubadas a 37 °C por 24 h. Após esse tempo, alíquotas foram semeadas em placas com ágar de Triptona de Soja, contendo 0,6% de extrato de levedura (TSA/EL) e incubadas a 37 °C por 24h. ao CMB do óleo essencial de gengibre foi de 4,0% para ambas as cepas da bactéria, indicando um potencial bactericida no controle de Listeria monocytogenes. Entretanto, esta é uma CMB alta, podendo influenciar em características sensoriais quando aplicado diretamente em alimentos, porém, novos estudos são necessários para avaliar a utilização do óleo essencial pela indústria alimentícia como um conservante natural alimentar.
Palavras–chave: antibacteriano, conservante natural, especiarias, Listeria monocytogenes
Abstract: The essential oils (EO) of spices are efficient natural antibacterials exhibiting effectiveness in the control of spoilage and pathogenic microorganisms of food origin. Such food preservation properties have been intensively studied in line with the growing popular awareness of the health risks linked to the consumption of artificial chemical food preservatives. Thus, the aim of this study was to determine the minimum bactericidal concentration (MBC) of ginger EO on Listeria monocytogenes ATCC 7644 and ATCC 15313 strains. The MBC was determined by the broth microdilution technique, in 96-well polystyrene plates. The essential oil was diluted in TSB containing 0.6% of yeast extract and 0.5% of Tween 80, obtaining concentrations from 4 to 0.03%. Aliquots of 100 μL of the oil solution were added to the first well of each line, containing 100 μL of TSB/EL, and serially diluted to obtain the concentrations described above.10 μl aliquots of the culture, containing 108 CFU/mL were inoculated and the microplates were sealed and incubated at 37°C/24 h. Aliquots were seeded on plates with TSA/EL and incubated at 37°C/24h. Ginger essential oil showed 4.0% MBC for both bacterial strains, indicating a bactericidal potential in the control of Listeria monocytogenes. However, this is a high MBC, which may influence sensory characteristics when applied directly to food, however, further studies are needed to evaluate the use of essential oil by the food industry as a natural food preservative.
Key Word: anti-bacterial; natural preservative; spices; Listeria monocytogenes
INTRODUÇÃO
Óleos essenciais (OEs) são reconhecidos como os compostos biológicos e ativos de plantas, como as especiarias, compondo de 1 a 17% do extrato desta planta. Em maioria, trata-se de substâncias lipofílicas, com algumas exclusões à compostos que possuem capacidade de solubilizar em água, podendo ser separados em grupos: monoterpenos, ácidos fenólicos, alcaloides, flavonoides, carotenoides e aldeídos (1).
Os agentes antimicrobianos naturais e sustentáveis surgem para suprir a exigência de consumidores que almejam a substituição dos conservantes alimentares tradicionais. O OEs de especiarias são geralmente classificados como atóxicos e possuem eficiências comprovada sobre os microrganismos, tanto in vitro como in vivo. Têm origem a partir do metabolismo de flores, folhas, raízes, cascas, frutos e sementes de diversas plantas de especiarias, formando uma combinação complexa e volátil, na maioria dos casos, sendo denominado de óleo essencial ou aromático, como é indicado na Figura 1 (2).
Quando presentes em alimentos, os microrganismos podem deteriorá-los ou serem causadores de doenças, sendo assim denominados como microrganismos patogênicos. O uso de conservantes químicos dentro da faixa definida pode garantir a segurança alimentar. Mas, a extensão exacerbada do uso destes conservantes químicos, pode potencializar um risco iminente à saúde humana. Tal fato é uma condição desafiadora, pois a indústria de alimentos tem se valido cada vez mais da utilização de agentes de conservação e antimicrobianos artificiais para inativar ou inibir o crescimento de microrganismos patogênicos e deteriorantes. Comparados aos conservantes artificiais, os óleos essenciais atingem ação antimicrobiana semelhante, no entanto, se sobressaem em seus aspectos de segurança para o consumo humano (1).
Os OEs possuem destaque por sua atividade bactericida sobre bactérias patogênicas e ação antifúngica. Dentre as plantas que apresentam essas substâncias, com concentrações baixas de óleo essencial (OE) e sabor suave, destaca-se o curry, kaempferia, louro, romã, gergelim, manga e ajowan; de aroma picante, é possível citar a pimenta, pimentão, gengibre, alho, cebola, asafetida, capim- limão, galangal maior e mostarda preta e como especiarias naturais de sabor forte, sobressaem o cravo, anis estrelado, cardamomo, erva-doce, cássia , orégano, tomilho, noz-moscada, aipo, coentro, alcaravia, endro e manjericão, dentre outros, sendo estes os três principais tipos de plantas de especiarias. Os mecanismos de ação dos OEs (Figura 2) e seus compostos sobre os microrganismos são diversificados, podendo agir em diferentes alvos celulares e inibir a produção de toxinas (1, 4, 5).
Dentre os condimentos vegetais e seus derivados estudados a fim de evitar a oxidação e deterioração dos alimentos, tem destaque o OE de gengibre (Zingiber officinale). Predomina em sua composição como composto majoritário, o monoterpeno oxigenado geranial, em concentrações variáveis, porém em torno de 25%, além de poder apresentar como constituintes o neral, o 1,8-cineol, geraniol, acetato de geranila e o monoterpeno bicíclico, canfeno, quando extraídos diretamente da planta ou predominar o alfa-zingibereno, seguido por beta-sesquifelandreno, tudo a depender da origem da planta (6).
A atuação dos compostos antimicrobianos dos óleos essenciais, pode ser mais bem evidenciada sobre bactérias Gram-positivas do que sobre bactérias Gram-negativas, em razão de sua parede celular ser rica em polissacarídeos, fator inibitório a penetração das substâncias antimicrobianas. Dentre as bactérias Gram-positivas, está a bactéria L. monocytogenes, capaz de causar a doença listeriose de letalidade em torno de 20-30% entre os acometidos. Esse e outros microrganismos patogênicos podem ser inibidos por óleos essenciais em virtude do impacto antimicrobiano propiciado por moléculas biologicamente ativas da composição dos OEs, podendo exercer sua funcionalidade antimicrobiana e inseticida na composição de embalagens, ou ainda serem utilizados na preservação de alimentos, alcançando o padrão de excelência de ação exigido pelas indústrias (7, 8, 9).
Diante do exposto, o objetivo deste estudo foi avaliar a capacidade do óleo essencial de gengibre em inibir o crescimento de duas cepas de Listeria monocytogenes, ATCC 7644 e ATCC 15313e determinar a sua concentração mínima bactericida (CMB).
MATERIAL E MÉTODOS
O estudo foi realizado no Laboratório de Microbiologia de Alimentos, no Departamento de Ciências dos Alimentos da Universidade Federal de Lavras.
O óleo essencial de gengibre (Zingiber officinale) foi adquirido da FERQUIMA® Indústria e Comércio Ltda (Brasil).
As cepas empregadas foram L. monocytogenes ATCC 7644 e L. monocytogenes ATCC 15313, pertencentes ao Laboratório de Microbiologia de Alimentos/ DCA-UFLA, adquiridas da Seção de Coleção de Culturas da Divisão de Biologia Médica do Instituto Adolfo Lutz, em São Paulo- SP.
As culturas estoques foram mantidas congeladas em meio de congelamento (glicerol 15%, peptona bacteriológica 0,5%, extrato de levedura 0,3%, NaCl 0,5% e água destilada), até a sua utilização. Anterior ao seu uso foi confirmada a pureza das culturas, empregando-se o equipamento MALDI-TOF MS Biotyper (Bruker).
A reativação das cepas foram realizadas inoculando-se alíquotas de 1 mL das culturas estoque em tubo de ensaio, contendo 10 mL de caldo de triptona de soja acrescido de extrato de levedura 0,6% (TSB- EL) e incubação a 37 °C por 24 horas.
Após esse período, alíquota de 100 μL das culturas foram transferidas para 100 mL de TSB-EL e incubadas a 37 °C até a obtenção de cerca de 108 UFC mL-1.
A padronização do inóculo foi realizada por curva de crescimento. A densidade óptica (DO 600nm) foi monitorada juntamente com a contagem em placa de ágar triptona de soja (TSA) suplementado com 0,6% (m/v) de extrato de levedura (EL). A absorbância encontrada foi 0,385 para L. monocytogenes ATCC 7644 e 0,135 para L. monocytogenes ATCC 15313, à concentração de 108 UFC mL-1.
A concentração mínima bactericida do óleo essencial foi determinada empregando-se a técnica de microdiluição em caldo com adaptações, utilizando placas de poliestireno de 96 cavidades (10). O óleo essencial foi homogeneizados em TSB-EL, acrescido de Tween 80 (0,5%). Foram avaliadas as concentrações de 4; 2; 1; 0,5; 0,25; 0,12; 0,06; 0,03 % (v / v). Alíquotas de 100 μL de solução do óleo foram adicionadas aos poços contendo 100 μL de TSB/EL e assim sucessivamente até as concentrações serem atingidas e alíquotas de 10 μl da cultura, contendo 108 UFC mL-1 foram inoculadas e as microplacas foram seladas e incubadas a 37 °C/24 h. Após esse período, foi realizado o plaqueamento de alíquotas das culturas em TSA-EL e incubadas a 37 °C por 24 horas. Foi realizado um controle negativo, contendo TSB-EL acrescido de 0,5% de Tween 80 e o óleo essencial. A CMB foi considerada a menor concentração de óleo essencial onde não se observou crescimento em placas das bactérias. O experimento foi realizado em triplicata e três repetições.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A partir do exposto na Tabela 1, é possível observar que tanto para a cepa ATCC 7644, quanto para a cepa ATCC 15313, o óleo essencial de gengibre apresentou a CMB de 4%. Embora tenha apresentado ação anti-listerial, a CMB obtida é considerada elevada, podendo alterar o sabor e odor dos alimentos quando aplicados em matrizes alimentares (11).
Por ser rico em monoterpenóides hidrofóbicos, o óleo essencial de gengibre pode ter exercido ação bactericida através do seu deslocamento da fase aquosa, rumo às estruturas da membrana celular. Estando concentrado no local, os compostos dos OEs na membrana citoplasmática das células bacterianas, poderão interferir na permeabilidade da bicamada lipídica, permitindo o extravasamento dos íons, redução da concentração do ATP e alteração do pH interno, além da redução do potencial elétrico da célula, inviabilizando a sua funcionalidade correta (6).
Cutrim et al. (12) ao testarem o óleo essencial de gengibre sobre bactérias, dentre elas uma Gram-positiva, E. coli, também detectaram inibição moderada ao microrganismo.
Reis et al. (13), ao avaliarem propriedades antibacterianas de diferentes OEs contra patógenos, obtiveram como resultado a ação efetiva do óleo essencial de gengibre apenas contra L. monocytogenes, porém somente nas três concentrações mais altas, sendo estas semelhantes à deste trabalho (3,0; 3,5 e 4,0%). Isso ocorreu mesmo diante de uso de técnicas diferentes pelos autores, que usaram o método de difusão em ágar– técnica do poço, com halos de inibição que variaram de 7 a 14mm, sendo os menores diâmetros referentes as menores concentrações do OE. Desse modo fica evidente a atividade inibitória do óleo, porém de potencial fraco.
CONCLUSÕES
Verificou-se que o óleo essencial de gengibre possui ação bactericida sobre as células das cepas de Listeria monocytogenes ATCC 7644 e ATCC 15313. A capacidade do óleo essencial de inibir o crescimento bacteriano permite que ele possua potencial para ser utilizado como antimicrobiano natural na indústria de alimentos, havendo, no entanto, a necessidade de mais estudos apara adequar a forma de uso, uma vez que a concentração mínima bactericida apresentada é alta. Assim cabe observar o efeito do óleo essencial de gengibre nas características sensoriais e na vida de prateleira dos produtos em que for aplicado.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem à Universidade Federal de Lavras (UFLA), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas-Gerais (FAPEMIG) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
REFERÊNCIAS
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