A AVALIAÇÃO DE COLORAÇÕES HISTOQUÍMICAS NA PESQUISA HISTOPATOLÓGICA DE Helicobacter pylori
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Resumo expandido publicado nos Anais da III Mostra dos Trabalhos de Conclusão de Curso da Especialização em Vigilância Laboratorial em Saúde Pública. Para acessa-lo clique aqui.
Este trabalho foi escrito por:
Fernanda Alencar Rodrigues1; Thaís de Souza Lima2; Tomás Zecchini Barrese2; Cinthya dos Santos Cirqueira2
1Estudante do Curso de Vigilância Laboratorial em Saúde Pública – Programa de Imuno-histoquímica – CPA/NAP – IAL; E-mail: [email protected]
2,Docente/pesquisador do Depto de Anatomia Patológica – NAP – IAL.
Resumo: Estima-se que metade da população mundial apresente a mucosa gástrica colonizada por Helicobacter pylori, resultando em maiores riscos para o desenvolvimento de gastrite crônica, úlceras peptídicas, adenocarcinoma gástrico etc. A determinação histológica em lesões suspeitas constitui-se como uma importante ferramenta de diagnóstico de doenças crônicas gástricas de etiologia infecciosa. O objetivo do estudo consistiu em avaliar o desempenho das colorações histoquímicas Giemsa modificado e Warthin-Starry em biópsias gástricas, fixadas em formalina e incluídas em parafina, com detecção imuno-histoquímica positiva para Helicobacter pylori. A pesquisa para a presença da bactéria foi feita nas glândulas e fovéolas da mucosa gástrica, em todos os campos das lâminas e classificadas em abundantes ou escassas. Foram realizados cortes histológicos em 16 amostras de 14 pacientes para nova pesquisa imuno-histoquímica e coloração de Giemsa modificado e Warthin-Starry. Entre as 16 amostras coradas por imuno-histoquímica, foi possível observar a presença de partículas antigênicas em 15 (93,8%), sendo 9 (60%) consideradas abundantes e 6 (40%) escassas. Através da coloração de Giemsa modificada foi observada a presença de espiroquetas, também, em 15 (93,8%) das 16 amostras analisadas. Por meio da coloração de Warthin-Starry a presença da espiroqueta foi observada em 4 (80%) das 5 amostras avaliadas. As colorações de Giemsa modificado e Warthin-Starry, permitiram a identificação histológica bem sucedida e, podem se tornar ferramentas auxiliares promissoras, juntamente com a imuno-histoquímica, no diagnóstico histopatológico das lesões gástricas encaminhadas ao Centro de Patologia do Instituto Adolfo Lutz.
Palavras-chave:Corante de Giemsa; Helicobacter pylori; Impregnação com prata; Imuno-histoquímica
INTRODUÇÃO
A infecção por H. pylori apresenta um grande impacto na saúde pública, sendo principalmente observada nos países em desenvolvimento. Estima-se que, metade da população mundial tenha a mucosa gástrica colonizada por H. pylori, resultando em maiores riscos para o desenvolvimento de gastrite crônica, úlceras peptídicas, linfoma de tecido linfóide associado à mucosa e adenocarcinoma gástrico (RODRIGUES et al., 2003; MARQUES et al., 2006; ATHERTON; BLASER, 2018).
Esta infecção é considerada como principal fator de risco para o desenvolvimento do adenocarcinoma gástrico (SOUSA et al., 2021). Estimam-se que 65% a 80% dos cânceres gástricos estejam associados à sua presença (KARIMI et al., 2014). De acordo com o Instituto Nacional do Câncer, em 2020 foram diagnosticados 21.230 novos casos no Brasil, sendo 13.360 homens e 7.870 mulheres. Observa-se maior incidência de casos em países em desenvolvimento, onde 80% da população está colonizada, em contrapartida aos países desenvolvidos, onde a taxa de novos casos é de aproximadamente 50% (SOUSA et al., 2021).
Em relação ao diagnóstico, a pesquisa de H. pylori pode ser realizada por testes invasivos e não invasivos e a decisão de qual exame será realizado depende da individualidade de cada paciente, entretanto as duas ferramentas diagnósticas mais utilizadas são testes invasivos, como o teste de urease e a análise histopatológica (CAMIÑA et al., 2017).
A análise histológica é feita em material proveniente de biópsias realizadas durante a endoscopia em regiões do antro e do corpo da mucosa do estômago, para aumentar a probabilidade de um diagnóstico mais conclusivo (KATELARIS et al., 2021).
O exame anatomo-patológico é fixado em formalina e incluído em parafina (FFIP) e trata-se de uma ferramenta diagnóstica efetiva, que inclui entre diversas técnicas complementares a coloração base Hematoxilina-Eosina (H&E), as colorações histoquímicas e a imuno-histoquímica (IHQ).
As colorações histoquímicas evidenciam os componentes teciduais através das ligações químicas, permitindo importantes contribuições para a análise histológica na rotina de laboratórios de anatomia patológica (CAPUTO; GITIRANA; MANSO, 2010). Além disso, tendem a ser menos dispendiosas e geralmente realizadas em menor tempo, em relação à imunocoloração (KIERNAN, 2002).
Por sua vez, a técnica de IHQ é utilizada para a pesquisa de agentes patológicos e de processos neoplásicos, através da visualização cromogênica da ligação antígeno-anticorpo no local da lesão. Sua grande vantagem é a alta especificidade, já que o anticorpo estabelece ligações somente com o antígeno alvo (FERRO, 2014). Embora as espiroquetas possam ser identificadas através da coloração de H&E, as colorações histoquímicas (como por exemplo, GM e WS) tornam essas bactérias mais evidentes, garantindo melhor a visualização de sua morfologia, enquanto a IHQ permite a identificação do patógeno (BARLETT, 2008; BARBOSA et al., 2013). Assim, estas colorações se tornaram efetivas como ferramentas diagnósticas, sendo apropriadas para a investigação de espiroquetas (LAINE et al., 1997) em lesões suspeitas.
Buscar a ampliação das metodologias histopatológicas que contribuam com o diagnóstico das lesões gástricas, constitui-se de grande importância para o tratamento e redução dos óbitos ocasionados por neoplasias, que são atualmente, uma das doenças mais prevalentes e custosas para o sistema de saúde do estado de São Paulo (BRASIL, 2020). Diante do exposto, o objetivo do presente estudo foi avaliar o desempenho das colorações histoquímicas Giemsa modificado (GM) e Warthin-Starry (WS) em cortes histológicos parafinados de biópsias gástricas em relação à pesquisa IHQ para o H. pylori.
MATERIAIS E MÉTODOS
Trata-se de um estudo de caráter retrospectivo, transversal, descritivo, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto Adolfo Lutz (CEP-IAL 4.487.151) e pelo Conselho Técnico Científico do Instituto Adolfo Lutz (CTC-IAL 05-M/2020).
Foram incluídas neste estudo, amostras de biópsias gástricas, do período de 2015 a 2020, com detecção imuno-histoquímica positiva para H. pylori na avaliação diagnóstica, cujo material, após o diagnóstico anátomo-patológico, ainda estava armazenado sob a guarda do Núcleo de Anatomia Patológica do Centro de Patologia no Instituto Adolfo Lutz (NAP/CPA/IAL).
Para cada amostra selecionada foi feita a microtomia de cortes histológicos parafinados sequenciais para a realização das colorações de H&E, GM, WS e IHQ. A espessura dos cortes foi de 6µm para WS e 3µm para as demais.
As colorações de H&E e de IHQ para H. pylori foram realizadas novamente com a finalidade de comprovar a permanência da lesão e do agente infeccioso nas amostras após os fragmentos de biópsias terem sido explorados para o diagnóstico anátomo-patológico.
A coloração de H&E foi realizada conforme procedimento operacional padrão (POP) do Laboratório de Histopatologia do NAP/CPA/IAL.
A reação de IHQ foi realizada no Laboratório de Imuno-histoquímica do NAP/CPA/IAL, e os aspectos principais e críticos da reação IHQ para a pesquisa de H. pylori estão sumarizados no Quadro 1. Para todas as colorações, foi utilizado como controle, uma amostra de biópsia gástrica com presença confirmada de H. pylori.
As colorações de GM e de WS foram realizadas conforme protocolo citado por Morris e colaboradores (2018). Todas as amostras foram coradas por GM e, para WS foram escolhidas 5 amostras baseadas na quantidade (abundantes e escassas) de bactérias visualizadas na coloração de IHQ.
A leitura e avaliação das colorações foram orientadas por um médico patologista e realizada para todas as lâminas de uma mesma coloração, por vez. A pesquisa das bactérias foi feita na mucosa gástrica, precisamente nas glândulas e fovéolas, em todos os campos das lâminas, seguida da classificação em relação à detecção (presença ou ausência) nas três colorações (GM, WS, IHQ) e quantidade (abundante/escassa) através da IHQ.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Das 16 amostras FFIP provenientes de 14 casos positivos ao exame imuno-histoquímico para H. pylori foi possível observar a presença de partículas antigênicas referentes à espiroqueta em 15 (93,8%) delas. Em relação à avaliação da quantidade do patógeno, 9/15 (60%) foram consideradas abundantes e seis 6/15 (40%) escassas.
Em 1 (6,2%) dos casos foi observada a discordância com o resultado da avaliação diagnóstica, já que não foi visualizada a presença de H. pylori nas novas colorações IHQ e histoquímicas. Tal desenlace justifica-se, possivelmente, pelo esgotamento da área de representatividade da lesão após o desbaste do bloco.
Os resultados obtidos através da coloração de GM foram considerados satisfatórios, pois foi observada a presença de espiroquetas em 93,8% (15/16) das amostras analisadas, de forma semelhante aos verificados para a coloração de IHQ. Entretanto, houve dificuldade de visualização nítida do agente patogênico em algumas amostras.
Estas ponderações são concordantes com o trabalho de Wabinga (2002) que recomenda as duas colorações (GM e IHQ) para o uso em rotina nos laboratórios de anatomia patológica africanos, mas contrapõem com os apontamentos de Loffeld e sua equipe (1991) sobre a dificuldade em identificar as espiroquetas na coloração de GM, ocasionada pelo contraste insuficiente entre a bactéria e o tecido.
Em relação à coloração de WS, foi possível observar a presença de H. pylori em 80% (4/5) das amostras avaliadas. Houve relativa facilidade na identificação das espiroquetas, favorecida pelo forte contraste que a coloração de WS tipicamente oferece. Resultado bastante semelhante ao encontrado por Sandhika (2019) que, compararam as colorações GM e WS para a identificação de H. pylori e, observaram que a bactéria pode ser facilmente evidenciada por WS, tanto em casos com baixa densidade ou com alta densidade.
Em nosso estudo, o desempenho encontrado para colorações histoquímicas em relação à imuno-histoquímica foi semelhante quanto à detecção das espiroquetas (Figuras 1 e 2), assim como relatado por Kocsámar e colaboradores (2017) que avaliaram 2.896 pacientes e obtiveram desempenho semelhante entre as técnicas empregadas. Entretanto, são necessárias novas pesquisas visando investigar, em um maior número de casos, a associação da atividade inflamatória à quantidade de patógenos observados em cada coloração. Para que estas colorações possam ser utilizadas como técnicas de triagem, destinando para o exame imuno-histoquímico, que é uma técnica mais sensível e específica, apenas os casos que necessitem de confirmação diagnóstica da etiologiaou da avaliação mais refinada de lesões gástricas com escassas quantidades deste patógeno.
CONCLUSÕES
As colorações histoquímicas de GM e WS apresentaram desempenho satisfatório e, possibilitaram a identificação histológica bem-sucedida de H. pylori, podendo se tornar ferramentas auxiliares promissoras, juntamente com a IHQ, no diagnóstico histopatológico das lesões gástricas, encaminhadas ao NAP/CPA/IAL.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a todos do Núcleo de Anatomia Patológica do Instituto Adolfo Lutz por todo suporte para realização desse trabalho.
REFERÊNCIAS
- RODRIGUES, O. et al. Sensibilidade e especificidade das alterações histopatológicas de mucosa gástrica antral para o diagnóstico da infecção pelo Helicobacter pylori. Rio Grande: Vittale, v. 15, n. 1, p. 89-99, 2003.
- MARQUES, T. REIS, C. A. NOGUEIRA, A. M. M. F. O papel das mucinas gástricas na infecção por Helicobacter pylori. Minas Gerais: Rev Med Minas Gerais, v. 16, n. 1, p. 38-42, 2006.
- ATHERTON, J. C.; BLASER, M. J. Helicobacter pylori. In: JAMESON, J. L. et al. Harrison’s principles of internal medicine. Nova York: McGrall-Hill, 2018.
- SOUSA, D. H. A. A. et al. Helicobacter pylori como principal fator de risco para adenocarcinoma gástrico. Curitiba: Brazilian Journal of Health Review, v. 4, n. 2, p. 4149-4158, 2021.
- KARIMI, P. et al. Gastric Cancer: Descriptive Epidemiology, Risk Factors, Screening, and Prevention. Estados Unidos: Cancer Epidemiol Biomarkers Prev, v. 23, n. 5, p. 700-713, 2014.
- Estatísticas de câncer. Instituto Nacional do Câncer, 2021. Disponível em: <https://www.inca.gov.br/numeros-de-cancer>. Acesso em: 30/11/2021.
- CAMIÑA, R. H. et al. Comparação entre teste de urease e histopatologia na identificação do Helicobacter pylori. Paraná: Gastroenterol. Endosc. Dig., v. 36, n.1, p. 1-6, 2017.
- KATELARIS, P. et al. World Gastroenterology Organization Global Guidelines: Helicobacter pylori. 33 p., 2021.
- CAPUTO, L. F. G. GITIRANA, L. B. MANSO, P. P. A. Técnicas Histológicas. In: MOLINARO, E. M. CAPUTO, L. F. G. AMENDOEIRA, M. R. R. (Org). Conceitos e métodos para formação de profissionais em laboratórios de saúde. Rio de Janeiro: EPSJV; IOC, Cap. 3, 2010.
- KIERNAN, J. A. Silver Staining for Spirochetes in tissues: rationale, difficulties, and troubleshooting. Canada: Laboratory Medicine, v. 33, n. 9, p. 705-708, 2002.
- FERRO, A. B. Imuno-histoquímica. Lisboa: Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Lisboa. 138 p. 2014.
- BARLETT, J. H. Microorganisms, 2008. In: BANCROFT, J. D. Theory and Practice of Histological Techniques. Elsevier, 6 ed., cap. 17, p. 317-326.
- BARBOSA, A. J. A. RODRIGUES, M. A. M. Tubo digestivo. In: FILHO, G. B. Bogliolo Patologia. 8 ed. Cap. 20, p.703-766, 2013.
- LAINE, L.; LEWIN, D. N.; NARITOKU, W.; COHEN, H. Prospective comparison of H&E, Giemsa, and Genta stains for the diagnosis of Helicobacter pylori. Los Angeles: Gastrointestinal Endoscopy, v. 45, n. 6, p. 463-467, 1997.
- BRASIL. Ministério da Saúde (MS). Plano Nacional de Saúde 2020-2023. Brasília, DF: Ministério da Saúde, fev. 2020.
- MORRIS, G. B. RIDGWAY, E. J. SUVARNA, S. K. Traditional stains and modern techniques for demonstrating microorganisms in histology. In: Bancroft’s Theory and Practice of Histological Techniques. [S.l.], p. 254–279, 2018
- WABINGA, H. R. Comparison of immunohistochemical and modified Giemsa stains for demonstration of Helicobacter pylori infection an African population. Uganda: African Health Sciences, v. 2, n. 2. p. 52-55, 2002.
- LOFFELD, R. J. L. F. et al. Helicobacter pylori in gastric biopsy specimens. Comparison of culture, modified giemsa stain, and immunohistochemistry. A retrospective study. Netherlands: Journal of Pathology, v. 165, p. 69-73, 1991.
- SANDHIKA, W. Detection of Helicobacter pylori infection in chronic gastritis biopsy specimen using warthin-starry and modified giemsa stain in Dr Soetomo Hospital Surubaya. Indonesia: Indonesian Journal of Tropical and Infectious Disease, v. 7, n. 6, 2019.
- KOCSMÁR, E. et al. Sensitivity of Helicobacter pylori detection by Giemsa staining is poor in comparison with immunohistochemistry and fluorescent in situ hybridization and strongly depends on inflammatory activity. Hungary: Wiley Online Library, v. 22, n. 4, p. 12387, 2017.