LEISHMANIOSE VISCERAL EM ÁREAS PRIORITÁRIAS DO MUNICÍPIO DE PRESIDENTE PRUDENTE/SP
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Resumo expandido publicado nos Anais da III Mostra dos Trabalhos de Conclusão de Curso da Especialização em Vigilância Laboratorial em Saúde Pública. Para acessa-lo clique aqui.
Este trabalho foi escrito por:
Éricka Stéphanny Brandão Bueno1; Gabriela Sumico Afonço Hanamoto1; Natalia de Moura Fagundes1, Lourdes Aparecida Zampieri D’Andrea2
1Estudante do Curso de Especialização Vigilância Laboratorial em Saúde Pública do Centro de Laboratório Regional – Instituto Adolfo Lutz de Presidente Prudente – CRPP – Email: [email protected]
2Docente/pesquisador Centro de Laboratório Regional–Instituto Adolfo Lutz de Presidente Prudente – CRPP
Resumo: Leishmaniose visceral (LV) é uma zoonose de distribuição mundial e fatal se não tratada precocemente. Objetivo foi avaliar as ações de vigilância e controle da LV em áreas prioritárias do município de Presidente Prudente/SP. Dados foram fornecidos pelo CCZ, vigilância epidemiológica da Secretaria Municipal de Saúde e Centro de Laboratório Regional Instituto Adolfo Lutz de Presidente Prudente (CRPP). Foram testados 48.365 animais, sendo 16.864 em 2018, 17.402 em 2019, 6.179 em 2020 e 7.920 janeiro a outubro de 2021, com positividade crescente para LVC (Leishmaniose visceral canina) de 1,9%, 2,2% e 3,8%, respectivamente e discreta redução em 2021 (2,9%). O padrão de distribuição espacial da LVC no município foi irregular no território e foi trabalhado ações de vigilância e controle da LV em seis áreas críticas em 2020: Maré Mansa–Imperial, São Sebastião–Residencial Jardins, Vila Formosa, Cedral– Monte Alto, Cláudia Glória–Santa Helena e São Matheus, com positividade média para LVC de 1,67%, valor inferior ao encontrado em 2020 (3,8%) no município. Provavelmente isso ocorreu por baixa circulação do parasita e de intensas ações realizadas em anos anteriores nessas áreas. Além disso, a positividade encontrada no bairro Monte Carlo em 2020 (3,9%) foi similar ao terceiro inquérito de 2018 (4,1%), ao do bairro Cedral–Monte Alto (3%) e a média da área urbana do ano de 2020 (3,8%). Ressalta-se, nesse sentido, que o bairro Monte Carlo é um fragmento do território representativo da situação epidemiológica da doença. Assim o projeto zeladoria foi uma importante ferramenta no combate a LV, sendo necessário dar continuidade nas ações de vigilância em saúde focadas em áreas prioritárias (críticas).
Palavras-chave: Distribuição espacial, leishmaniose visceral, Presidente Prudente/SP, vigilância e controle.
INTRODUÇÃO
A leishmaniose visceral (LV) ou calazar é uma antropozoonose de distribuição mundial e pode ser fatal quando não tratada precocemente. Nas Américas, a doença é causada pelo protozoário Leishmania infantum (sinonímia Leishmania infantum chagasi), sendo este um parasita intracelular obrigatório (ABRANTES et al., 2018; BRASIL, 2021). A transmissão ocorre principalmente através da picada do flebotomíneo Lutzomya longipalpis, por ser o vetor mais comum (SALES et al., 2017). Em ambiente urbano, o principal reservatório é o cão doméstico, tanto no Brasil como em outros países das Américas (ZUBEN; DONALISIO, 2016), ao passo que em ambiente silvestre, os reservatórios são raposas (Dusicyon vetulus e Cerdocyon thous) e marsupiais (Didelphis albiventris) (BRASIL, 2021).
Além disso, a LV tem sido disseminada rapidamente em todo o país, com destaque para a região oeste do Estado de São Paulo, onde a cidade de Presidente Prudente apresentou os primeiros relatos de casos da doença em cães (LVC) em 2010 (D’ ANDREA et al, 2015; ABRANTES et al., 2018). Assim, o Centro de Controle de Zoonoses (CCZ) da Secretaria Municipal de Saúde tem se empenhado em controlar os casos da doença na população canina do município (D’ANDREA et al, 2015; PRESTE-CARNEIRO et al, 2019).
Em 2018, foram avaliadas as ações de vigilância e controle da LV no bairro Monte Carlo em Presidente Prudente/SP, considerada área prioritária, a qual serviu como projeto piloto (FAGUNDES, 2020). Desta forma, a mesma metodologia foi aplicada nos anos de 2019 e 2020 em outras áreas semelhantes ou de risco para LV em região urbana da cidade.
É notória a importância da avaliação dos resultados obtidos com estas ações, bem como constituir pesquisas passíveis de serem aplicadas em outros municípios. Sendo assim, o objetivo deste trabalho foi avaliar as ações de vigilância e controle da leishmaniose visceral em áreas prioritárias do município de Presidente Prudente/SP.
MATERIAL E MÉTODOS
O estudo foi realizado de janeiro de 2018 a outubro de 2021, em região urbana de Presidente Prudente, localizada no extremo oeste do Estado de São Paulo, com população humana estimada de 207.725 habitantes e canina de 51.931 (IBGE, 2015; ALVES et al., 2005). A área pertence ao Departamento Regional de Saúde – DRS XI, com abrangência do Centro de Laboratório Regional Instituto Adolfo Lutz de Presidente Prudente (CRPP).
Os dados foram obtidos do Sistema de Informação e Gestão Hospitalar (SIGH), CRPP; boletins informativos com resultado do teste confirmatório ELISA de LVC de animais triados com teste rápido (TR-DPP®) no CCZ; e de relatórios online enviados mensalmente. Os dados obtidos de cada ano pesquisado foram analisados com o auxílio do software Excel 2016, onde foram confeccionadas planilhas, nas quais os cães com LV confirmada foram contabilizados e separados por quadras da área urbana.
Foram utilizados o mapeamento temático e a estatística descritiva com o software SIG ArcGIS, desenvolvido pela ESRI, para a identificação dos padrões de distribuição espacial. Desta forma, foi possível realizar agrupamentos dos casos, construir uma base de dados e elaborar mapas para a área urbana da região analisada, tendo como base a classificação de cães com teste rápido (TR DPP® LVC) e ELISA LVC reagentes, por quadra, no período de janeiro de 2018 a dezembro de 2020.
Além do exposto, foram analisados os resultados de inquéritos sorológicos de seis áreas prioritárias dentro do município de Presidente Prudente durante no ano de 2020: 1. Maré Mansa – Imperial, 2. São Sebastião–Residencial Jardins, 3. Vila Formosa, 4. Cláudia Glória–Santa Helena, 5. São Matheus e 6. Monte Carlo.
Em relação aos aspectos éticos, os dados fazem parte de resultados parciais obtidos com o protocolo “Identificação de áreas prioritárias para as ações de vigilância e controle da leishmaniose visceral no município de Presidente Prudente/SP/Brasil”, avaliado e aprovado pelo Comitê Técnico Científico do Instituto Adolfo Lutz – CTC-IAL 32-L/2019, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do IAL – CEPIAL, CAAE: 22168919.1.0000.0059, parecer Nº. 3.665.220.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram testados 48.365 animais, sendo 16.864 em 2018, 17.402 em 2019, 6.179 em 2020 e 7.920 janeiro a outubro de 2021 no município de Presidente Prudente. No mesmo período, foram notificados cinco casos de LV humana (LVH) no município, sendo um em 2018, três em 2020 e um em 2021, não tendo sido registrados casos em 2019.
A Tabela 01 mostra a distribuição dos resultados de inquérito sorológico para LVC no município, no período de janeiro de 2018 a outubro de 2021, onde é possível observar que a positividade na triagem sorológica de LVC nos anos de 2020 (7,5%) e 2021 (6,6%) registrou aumento em relação aos anos de 2018 (4,3%) e 2019 (3,1%), uma vez que, nesse período, o volume de testes realizados foi maior devido a demanda espontânea de animais sintomáticos; bloqueio de casos de LVH e LVC; e a realização de inquéritos em áreas prioritárias.
Em relação aos testes confirmatórios de LVC, ainda na tabela 01, observa-se aumento crescente da positividade nos anos 2018 (320-1,9%), 2019 (378-2,2 %) e 2020 (235-3,8%), no entanto no ano de 2021 (233- 2,9%) houve uma discreta redução. A positividade alta da LVC nos anos de 2020 e 2021 foi, provavelmente, em função da redução das atividades de inquérito, devido a intensificação de atendimento a demanda de animais sintomáticos e realização de bloqueio nos casos de LVH em 2020.
Esses resultados demonstram que houve dispersão do parasita no território, provavelmente pelo grande número de cães na região, além do reduzido quadro de recursos humanos do CCZ e da vigilância epidemiológica municipal. Tal cenário tornou impossível a atuação efetiva para o bloqueio da difusão da doença, tendo em vista que resultados inferiores foram encontrados por Matsumoto (2014) nos anos de 2010 a 2013 no município de Presidente Prudente onde os casos de LVC foram respectivamente: 14, 40, 30 e 19.
Outro aspecto importante observado no presente estudo foi o resultado obtido no bairro Monte Carlo, representado na tabela 2. Trata-se da continuidade de um estudo desenvolvido a partir de ações de vigilância e controle, nos anos de 2018 e 2020, onde foram realizados três inquéritos sorológicos, impulsionados pela identificação de grande número de cães com LVC em anos anteriores, além de um ambiente propício para a presença do vetor (FAGUNDES, 2020).
Como resultado, é possível observar o grande número de casos positivos de LVC (3,9%) no bairro Monte Carlo, no ano de 2020 em relação a 2018. Esse fato se deu provavelmente em decorrência da baixa circulação do parasita em função do recolhimento dos animais com LVC e das ações adotadas nos três inquéritos realizados do ano de 2018 (FAGUNDES, 2020). Dentre o total de animais analisados no inquérito com TR DPP® que foram realizados pelo município em 2020 (Tabela 01), cerca de 3,8% (231) pertenciam a cães do Residencial Monte Carlo. Outro dado importante observado foi que a positividade média de cães com LVC de 2020 (3,8%) foi similar a positividade encontrada no bairro Monte Carlo (3,9%). Isso sugere que o bairro estudado como prioritário é um fragmento do território do município representante da situação epidemiológica da doença.
Além do exposto, foi realizado o levantamento de cães com sorologia confirmada para LVC e a distribuição espacial representativa do quantitativo de animais no município, segundo a quadra da área urbana de Presidente Prudente/SP, no período de 2018 a 2020 (Figura 02). Sem dúvida, esta é uma ferramenta com grande importância na gestão e amplamente utilizada, uma vez que contribuem para tomada de decisão sobre determinada situação no território.
Neste ponto do trabalho, foi observada variação no padrão da distribuição espacial de cães com LVC de um ano para o outro, evidenciada na figura 02, uma vez que em 2020 houve menor número de animais testados (6.179) em relação a 2018 (16.864) e 2019 (17.402). Isso se deu em função da redução do número de kits recebidos e utilizados pelo município (Tabela 01); medidas restritivas impostas pela pandemia de covid-19; e sobrecarga dos serviços de saúde em 2020. Porém, houve uma positividade crescente de 1,9%, 2,2% e 3,8%, respectivamente.
Além disso, a ferramenta de distribuição espacial de cães com LVC dos anos de 2018 e 2019 propiciou a escolha de outras áreas críticas do município de Presidente Prudente, nas quais foram executadas mais intensamente as ações de vigilância e controle, bem como a realização de inquérito sorológico em 2020. Desta forma, os resultados obtidos nos inquéritos sorológicos, nas seis áreas identificadas como críticas do município de Presidente Prudente, estão descritos na Tabela 03, juntamente com a positividade no TR DPP®, ELISA para LVC, porcentagens de animais eutanasiados, tratamento e óbito.
Outro dado significativo observado nas áreas prioritárias estudadas em 2020, as quais apresentaram altos valores de positividade nos inquéritos realizados nos anos anteriores, foi a média da positividade dos resultados de ELISA de 1,67% (30), em relação a positividade de casos confirmados no território municipal 3,8% (235) no mesmo ano. É possível notar que a área do bairro Cedral-Monte Alto apresenta uma positividade 3% (14), similar ao valor encontrado na cidade de Presidente Prudente/SP no ano de 2020. Esses bairros foram elencados como áreas críticas do município segundo critérios de positividade de cães com LVC em inquéritos anteriores, além de possuírem fatores propícios ao desenvolvimento do vetor como fundo de vale, áreas de preservação permanente, acúmulo de matéria orgânica e baixo nível socioeconômico.
Assim, em 2021 foi desenvolvido o projeto zeladoria com o objetivo de manter a cidade de Presidente Prudente limpa e organizada, concentrando os serviços de limpeza e manutenção em 11 setores da cidade. Essa ação foi uma importante ferramenta que auxiliou no combate a LV em tempos de pandemia, embora seja necessária a continuidade das atividades de vigilância em saúde focadas em áreas prioritárias do município.
CONCLUSÃO
Foi identificado grande número de cães com sorologia reagente no TR DPP® para LVC com positividade crescente de 2018 a 2020 e discreta redução em 2021 e que houve diminuição do quantitativo de animais analisados no município de Presidente Prudente nos anos 2020 e 2021. Adicionalmente, percebe-se que a pandemia de covid-19 impactou nas atividades de vigilância em saúde da LV no município, embora estudos sejam necessários para confirma essa informação.
Por outro lado, o padrão de distribuição espacial da LVC no território de Presidente Prudente foi irregular. Destaca-se neste sentido a positividade encontrada para LVC no inquérito realizado no bairro Monte Carlo em 2020 (3,9%), a qual foi similar ao terceiro do ano de 2018 (4,1%), ao da área crítica do bairro Cedral–Monte Alto (3%) e a média da área urbana do ano de 2020 (3,8%).
É importante destacar que o Bairro Monte Carlo é um fragmento do território representativo da situação epidemiológica da doença no município e que a média de positividade de cães com LVC encontrada nas seis áreas prioritárias do município de Presidente Prudente em 2020 foi menor que a encontrada na média do município no mesmo ano, resultado das atividades de vigilância e controle realizada em anos anteriores. Este trabalho conclui também que o desenvolvimento do projeto de zeladoria no ano de 2021 foi uma importante ferramenta utilizada no combate a LV no município, embora seja necessária a continuidade das atividades de vigilância em saúde focadas em áreas prioritárias.
REFERÊNCIAS
ABRANTES, T. R. et al. Fatores ambientais associados à ocorrência de leishmaniose visceral canina em uma área de recente introdução da doença no Estado do Rio de Janeiro, Brasil. Cadernos de Saude Publica, v. 34, n. 1, p. 1–12, 2018.
ALVES, M. C. G. P. et. al. Dimensionamento da população de cães e gatos do interior do Estado de São Paulo. Revista Saúde Pública, v. 39, n. 6, p. 891-7, 2005.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Coordenação-Geral de Desenvolvimento da Epidemiologia em Serviços. Guia de Vigilância em Saúde: volume único. 5ª. ed. Brasilia: Ministério da Saúde, 2021. 1.126 p. Disponível em: <https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_vigilancia_saude_5ed.pdf>. Acesso em 30/11/2021.
D’ANDREA, L.A.Z. et al. The shadows of a ghost: a survey of canine leishmaniasis in Presidente Prudente and its spatial dispersion in the western region of São Paulo state, an emerging focus of visceral leishmaniasis in Brazil. BMC Veterinary Research, n.11, p. 273, 2015.
FAGUNDES, N. M. Leishmaniose Visceral em Área Prioritária do Município de Presidente Prudente/SP/Brasil: Avaliação das Ações de Vigilância e Controle/ Natalia de MouraFagundes– Presidente Prudente.46 f.Il., 2020.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE) 2015. Censo 2010. Disponível em: < https://censo2010.ibge.gov.br/>. Acesso em: 05/12/2021.
MATSUMOTO, Patricia Sayuri Silvestre. Análise espacial da Leishmaniose Visceral Canina em Presidente Prudente – SP: abordagem geográfica da saúde ambiental. 2014. xvii f. Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências e Tecnologia, 2014. Disponível em: <http://hdl.handle.net/11449/115755>. Acesso em 04/01/2022.
PRESTES-CARNEIRO, L.E. et al. Spatiotemporal analysis and environmental risk factors of visceral leishmaniasis in an urban setting in São Paulo State, Brazil. Parasites & Vectors. 2019 May 21;12(1):251.
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ZUBEN, A.P; DONALÍSIO, M.R. Dificuldades na execução das diretrizes do Programa de Vigilância e Controle da Leishmaniose Visceral em grandes municípios brasileiros. Cadernos de Saúde Pública. 2016, v. 32, n. 6, e00087415.