ANÁLISE DO PERFIL EPIDEMIOLÓGICO DAS Escherichia coli PATOGÊNICAS
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Resumo expandido publicado nos Anais da III Mostra dos Trabalhos de Conclusão de Curso da Especialização em Vigilância Laboratorial em Saúde Pública. Para acessa-lo clique aqui.
Este trabalho foi escrito por:
Amilson da Silva Ribeiro
Estudante do Curso de Vigilância Laboratorial em Saúde Pública – NCB – IAL CLR III
E-mail: [email protected]
RESUMO
Introdução: A Escherichia coli (E. coli) é uma bactéria bacilar anaeróbia facultativa pertencente a família Enterobacteriaceae presente na flora intestinal de humanos. Geralmente não são patogênicas, porém existem alguns sorogrupos que possuem diversos fatores de virulência que são capazes de produzir toxinas provocando quadros diarreiogênicos e outras doenças extraintestinais. O diagnóstico laboratorial é realizado através de culturas de amostras biológicas, provas bioquímicas de identificação e testes de biologia molecular. Objetivo: Este trabalho propõe descrever as características das E. coli patogênicas e o seu perfil epidemiológico. Metodologia: Foi realizado uma revisão bibliográfica baseando-se em livros, dissertações de mestrado, teses de doutorado, monografias e artigos científicos. Resultados e discussão: A EHEC/STEC O157:H7 é uma das principais linhagens causadoras de surtos de origem hídrica e alimentar e também é responsável por causar a Síndrome Hemolítico Urêmica (SHU). Outras cepas também podem provocar a SHU como a O104:H4 causadora de um surto de enorme proporção na Alemanha em 2011. No Brasil nos anos de 2009 a 2018, a E. coli foi o patógeno de maior relevância em surtos de doenças de origem alimentar. A EPEC foi o sorotipo mais identificado em surtos no estado de São Paulo entre 2009 e 2018. Conclusão: As E. coli patogênicas são constantemente isoladas em surtos no Brasil e pelo mundo, desse modo, portanto é preciso fortalecer o sistema de vigilância epidemiológica com o objetivo de prevenir novos casos de contaminação e surtos subnotificados.
Palavras-chave: Doenças transmitidas por alimentos, Epidemiologia, Escherichia coli e Surtos.
INTRODUÇÃO
A Escherichia coli (E. coli) é uma bactéria bacilar anaeróbia facultativa pertencente a família Enterobacteriaceae que possue habitat no intestino de humanos e animais. Foi identificada pela primeira vez pelo médico pediatra Theodor Von Escherich em 1885 (GOMES et al, 2016).
A maior parte das cepas de E. coli não são patogênicas, porém as linhagens que possuem potencial patogênico são capazes de produzir toxinas acarretando doenças específicas provocando sintomas graves que necessitam hospitalização (MADIGAN et al, 2016). São bastonetes não esporulados que em sua maioria são móveis, pois possuem a presença de flagelos peritríquios (GARCIA, 2021).
Existem ao total seis tipos de E. coli patogênicas que provocam infecção entérica em humanos, sendo elas: E. coli enterotoxigênica (ETEC), E. coli enteropatogênica (EPEC), E. coli enterohemorrágica ou produtoras de toxina Shiga (EHEC/STEC), E. coli enteroinvasiva (EIEC), E. coli enteroagregativa (EAEC) e E. coli aderente difusa (DAEC) (SOUZA et al, 2016).
Algumas espécies de E. coli patogênicas podem provocar sintomas como diarreia, enquanto outros causam infecções do trato urinário, doenças respiratórias, pneumonia, e outras doenças (CDC, 2021).
Dentre os sorogrupos mais virulentos as ETEC e STEC possuem uma distribuição mundial afetando majoritariamente crianças menores que 5 anos de idade. Cepas de ETEC provocam em média anualmente 380.000 mortes, principalmente em regiões com saneamento básico precário (OLIVEIRA, 2012).
Vale ressaltar que algumas cepas de E. coli possuem duas ou mais características de diferentes patótipos e, dessa forma, são denominadas espécies híbridas tornando-as mais virulentas e agressivas (GOMES et al, 2016). Como exemplo tem-se a E. coli O104:H4 que possui características da E. coli enterohemorrágica (EHEC) e também da E. coli enteroagregativa (EAEC) (CVE, 2011).
As cepas de E coli patogênicas e comensais são similares fenotipicamente, dificultando sua identificação nos laboratórios de análise, assim o uso de métodos moleculares são importantes para o seu diagnóstico clínico (MOLINA et al, 2021).
Neste sentido este trabalho tem o objetivo de apresentar as principais características patológicas das E. coli patogênicas relatando os surtos e a frequência de infecção provocada por esses patótipos através de dados epidemiológicos. Apresentar a importância desse grupo de enterobactérias responsáveis por grande parte dos surtos alimentares e de outras infecções de notificação compulsória.
MATERIAL E MÉTODOS
Este trabalho foi elaborado através de uma revisão bibliográfica baseando-se em livros, manuais, monografias, sites de pesquisa, teses de mestrado e doutorado e artigos científicos. Foi utilizado como organizador de artigos e referências, o software Mendeley. Definiu-se trabalhar com as seguintes bases de dados Biblioteca virtual em saúde (BVS), MEDLINE, SciELO, EBESCO, LILACS e Google acadêmico. Assim foram consultadas informações referentes ao perfil epidemiológico das E. coli patogênicas nas esferas mundial, nacional e estadual, utilizando-se de descritores como Escherichia coli, Surtos, doenças transmitidas por alimentos e epidemiologia.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Situação epidemiológica das E. coli no mundo
Nos Estados Unidos em 1993, um surto de enorme proporção provocado por E. coli O157:H7 envolveu mais de 700 pessoas em 4 estados do país, com 51 casos de SHU e 4 mortes confirmadas.
Em 1996, no Japão, ocorreu o maior surto provocado por E. coli O157:H7 no qual mais de 8.000 pessoas foram infectadas,106 crianças desenvolveram SHU e três foram a óbito (PAULA et al, 2014).
Em 2011, na Alemanha, iniciou-se um surto que se expandiu até outros países da Europa e América do Norte contaminando 4.000 pessoas, sendo que desse total houve 845 casos de SHU com 54 mortes.
De acordo com alguns estudos, o patógeno causador deste surto foi o sorotipo O104:H4 que possui fatores de aderência agregativa e produção de stx2, o que indica um perfil híbrido de EAEC e STEC (SANTOS et al, 2020).
O gráfico 1 demonstra o número de casos identificados no surto que ocorreu na Alemanha entre maio e junho de 2011. Nesse período foram registrados 2694 casos de STEC e 720 casos de SHU associados com quadros de diarreia aguda.
Situação epidemiológica das E. coli no Brasil
Na década de 1980, o patotipo EPEC foi responsável por causar aproximadamente 30% dos casos de diarreia infantil, sendo os sorotipos O111, O55 e O119 os principais causadores (GOMES et al, 1991).
De acordo com dados epidemiológicos, na década de 1990, os patotipos EPEC atípica e EAEC foram os sorotipos mais encontrados nos casos de diarreia aguda, tanto em crianças como em adultos (ORLANDI et al, 2006).
No ano de 2002, ocorreu o primeiro caso registrado de E. coli O157 em doenças em humanos, o patotipo foi isolado de três pacientes que apresentavam um quadro de diarreia sanguinolenta que é um dos principais sintomas da doença (IRINO et al. 2002).
Em 2019, ocorreu um surto em uma creche no estado do Espirito Santo com 22 pessoas atingindas e 1 óbito registrado. Segundo a Vigilância Epidemiológica, o patotipo identificado continha o gene stx2 demonstrando a presença da E. coli STEC/EHEC (SESA, 2019).
Os surtos provocados pelas E. coli patogênicas geralmente estão associados a doenças transmitidas por alimentos (DTA) que corresponde a um incidente com 2 ou mais pessoas que apresentam como principal sintoma a doença diarreica aguda que provoca diversas evaquações com fezes aquosas (CVE, 2011).
Observando o gráfico 2 fica evidente que a Escherichia coli é o agente etiológico mais identificado em surtos de DTA no período de 2009 a 2018 com cerca de 23,4% dos surtos , seguido de Salmonela spp com 11,3% confirmados.
Situação epidemiológica das E. coli no estado de São Paulo
Na cidade de São Paulo, as EPEC típicas foram os principais agentes etiológicos de diarreia infantil desde a década de 50, o que corresponde a 30% dos casos somente no primeiro ano de vida (OLIVEIRA, 2012).
Em 2006, foram identificados 106 casos de EPECsorogrupo O128, sendo o patotipo EPEC o mais identificado nesse período. Nos anos 2006, 2013 e 2014 ocorreram três óbitos provocados por E coli patogênica (AGUIAR, 2019). Na cidade de São Paulo, sorotipos não O157:H7 foram identificados como causadores de SHU (Souza et al, 2007). De acordo com o gráfico 3, no período de 2009 a 2018, o número de casos provocados por E. coli no estado de São Paulo foi maior em 2011 com o total de 234 casos e o menor indice ocorreu em 2016 com 22 casos. Nesse mesmo período, o sorotipo de E. coli mais identificado foi a EPEC como o total de 210 casos.
Observando o gráfico 4, o ano de 2011 obteve o maior número de casos ocasionados por E. coli associados a outros patógenos totalizando 6.143 casos, ao contrário do ano de 2015 no qual não houve registros.
CONCLUSÕES
As E. coli patogênicas podem representar um potencial risco para a saúde pública, pois é um microrganismo versátil com facilidade de adquirir vários fatores de virulência criando novos sorotipos com capacidade de causar novas doenças.
Entre 2009 a 2018, as E. coli foram os patógenos mais identificados em surtos transmitidos através de alimentos ressaltando a importância de realizar inquéritos epidemiológicos para identificar o patógeno causador de um surto.
Os números de surtos causados por DTHA são subnotificados no Brasil e a investigação da maioria acabam não chegando no agente causador. É preciso melhorar os sistemas de vigilância e bem como treinar melhor as equipes para as investigações dos surtos.
Dessa forma, espera-se que as E. coli patogênicas continuem aparecendo, sendo em casos esporádicos ou em surtos, pois ainda são frequentemente isoladas como contaminantes em amostras de alimentos e de reservatórios animais.
REFERÊNCIAS
AGUIAR, M. L. Ocorrência de diarreias associadas as Escherichia coli diarreiogênicas. 47f. Monografia (Especialização em Vigilância Laboratorial em Saúde Pública) – Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, Instituto Adolfo Lutz, São Paulo, 2019.
CDC, Centers for Disease Control and Prevention. E. coli (Escherichia coli). Disponível em: <https://www.cdc.gov/ecoli/>. Acesso em: 20 out. 2021.
CVE/SES-SP – Centro de Vigilância Epidemiológica. Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Divisão de doenças de transmissão hídrica e alimentar. Síndrome Hemolítico-Urêmica e Escherichia coli O104:H4e o surto na Alemanha. São Paulo, 2011.
GARCIA, L. N. H. Identificação e caracterização de Escherichia coli diarreiogenica de abatedouro misto de bovinos e suínos. 69f. Dissertação (Mestrado em Medicina Veterinaria) – Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, 2021.
GOMES, T. A. T. et al. Enteropathogens associated with acute diarrheal disease in urban infants in São Paulo, Brazil. Journal of Infectious Disease, v. 164, n. 2, p. 331-337, 1991.
GOMES, T. A. T. et al. Diarrheagenic Escherichia coli. Brazilian Journal of Microbiology, v. 47, n. 4, p. 3–30, 2016.
IRINO, K. et al. O157 Shiga toxin-producing Escherichia coli strains associated with sporadic cases of diarrhea in São Paulo, Brazil. Emerging Infectious Diseases, v. 8, p. 446-447, 2002.
MADIGAN, T. M.; MARTINKO, J. M.; BENDER, K. S.; BUCLEY, D. H.; DAVID, A. S.; Microbiologia de Brock. 14. ed., Porto Alegre: Artmed, 2016.
MOLINA, N. B. et al. Primer reporte de Escherichia coli diarreogénica en población pediátrica ambulatoria con diarrea atendida en la ciudad de La Plata, Argentina. Revista Argentina de Microbiologia, La Plata, abr. 2021.
OLIVEIRA, J. J. Surtos alimentares de origem bacteriana: uma revisão. 36f. Seminário (Disciplina Seminários aplicados do Programa de Mestrado em Ciência Animal). Escola de Veterinária e Zootecnia, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2012.
ORLANDI, P. P. et al. Etiology of diarrheal infections in children of Porto Velho (Rondônia, Western Amazon region, Brazil). Brazilian Journal of Medical and Biological Research, v. 39, n. 4, p. 507- 517, 2006.
PAULA, C. M. D. et al. Escherichia coli O157:H7 — patógeno alimentar emergente. Vig Sanit Debate. v. 2, n. 4, p. 23-33, 2014.
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SESA, Secretaria do estado da Saúde do Espirito Santo. Investigação do Surto de doença diarreica aguda ocorrido no município de Vila Velha. Vila Velha, 2019.
SOUZA, C. O. et al. Escherichia coli enteropatogênica: uma categoria diarreiogênica versátil. Rev Pan-Amaz Saude, v. 7, n. 2, p. 79-91, 2016.
SOUZA, R. L.; NISHIMURA, L. S.; GUTH, B. E. C. Uncommon Shiga toxin-producing Escherichia coli serotype O165:HNM as cause of hemolytic uremic syndrome in São Paulo, Brazil. Diagnostic Microbiology and Infectious Disease. v. 59, n. 2, p. 223-225, 2007.